Crônica 14 - Na baía do Cumã.
- @joaocabenaestrada
- 7 de jan. de 2021
- 3 min de leitura
Confirmei no cais de Alcântara a possibilidade de atravessar a Baía de Cumã que divide a pacata comunidade de Ponta de Areia e o município de Guimarães. Já passava das 8 horas e o sol estava dominando o céu aberto. Pensei no calor que iria enfrentar mas, ao mesmo tempo, a pouca distância até o meu destino me tranquilizava. Pouco mais de 40 km, a maioria deles em estrada de chão que aqui chamam de piçarra.

Subindo a ladeira do jacaré conheci o Nizael, ciclista e bastante conhecido na região. Esse encontro me trouxe uma sucessão de outros bons encontros até o meu destino. Além de me passar ótimos contatos, o Nizael se propôs a me acompanhar de moto até a comunidade de Santa Maria. Logo depois de uma boa e relaxante sessão de alongamento com o Cícero, eu e o Nizael seguimos. Conversamos bastante pelo percurso e ouvi ótimas dicas sobre lugares e onde ficar. O Nizael foi cuidadoso nas explicações e referências, fazia questão de repetir pra que eu não me perdesse e pudesse aproveitar o máximo daquele trecho. Passamos por diversas comunidades quilombolas como Pepital, Marudá e Tacauá. Nizael se despediu pouco antes de Santa Maria após um registro. Chegar até Ponta de Arei sem a ajuda dele teria sido complicado, a estrada tem muitos desvios mas também comunidades onde eu poderia me informar, o que levaria algum tempo.

Ponta de Areia é uma vila de pescadores afastada da praia Ponta de Areia e Praia do Lago mas à beira da Baía de Cumã. Pacata, com o comércio necessário para abastecer os próprios moradores, uma pequena capela católica, um campo de futebol, uma associação de moradores e muitas mangas carregadas. No final da única rua que corta o vilarejo, duas casas isoladas e um pequeno espaço onde os barcos de pesca atracam. São os próprio pescadores que fazem a travessia. Quando cheguei desconfiei de que teria de passar a noite no vilarejo. O Maranhão tem uma das maiores variações de marés do mundo e os pescadores seguem rigorosamente a tábua de marés para terem condições de saírem com as embarcações, pelo contrário teriam de empurrar as canoas por mais de 1km até o rio. O que seria impossível!
Voltei para a parte central da vila e amarrei minha rede na varanda do quiosque de Seu Benedito. Um dos contatos do Nizael. Descansei um pouco e encontrei um chuveiro atrás do quiosque. Desconfiei da movimentação ali atrás além do chuveiro, descobri que existe uma senhora responsável por ligar a bomba que distribui água e abastece toda a cidade, mas que, quando a prefeitura deixa de pagar seu salário ela, numa forma de protestar, cancela a distribuição da água para a comunidade.

Banhei e fui atrás de pão, precisava comer o mais rápido possível. Já estava sentindo meu estômago encostando nas costas. Bem, pão em Ponta de Areia somente de manhã quando o ônibus chega de Alcântara e permite que os moradores tenham o tradicional café da manhã brasileiro, se houver qualquer contratempo, não tem pão e foi o que aconteceu. O motorista decidiu não ir até Alcântara nesta manhã.
Ao lado de onde amarrei a rede, numa pequena mercearia, conheci Maria que gentilmente me ofereceu além do pão, café com leite. Ali também conheci a esposa de um pescador que possivelmente me atravessaria para Guimarães de graça assim que saísse para pescar às 6h.

Uma noite refrescante, num lugar silencioso, deitado numa rede, era tudo o que desejava.
Logo cedo desci para o pequeno atracadouro na esperança de encontrar uma boa carona. Numa casa ao lado tomei um gole de café e aproveitei o sinal da operadora para atualizar a família.
Por volta das 8 horas consegui um barco.
A baía do Cumã estava agitada e parecia ainda mais por causa do pequeno barco que estávamos. As ondas mais à frente onde a largura passa dos 8 quilômetros jogava para todos os lados e a água barrenta mexia com minha imaginação. Uma grande caravela lilás, também comum na Bahia passou boiando próximo do barco. Ali, os três pescadores dividiram as tarefas, enquanto um conduzia o barco em baixa velocidade, o outro na frente entregava a rede e jogava as boias de sinalização, o outro atrás lançava a rede e desembaraçava se houvesse necessidade, qualquer vacilo e um deles cairia no mar. Ficamos pouco mais de 30 minutos para abrir uma rede de 700 metros.
Seguimos para Guimarães, no cais da cidade, lavei a relação da bicicleta e montei os alforjes. Fiquei um tempo no Centro pensando o itine
rário.
Viajar próximo ao litoral norte do Maranhão tem muitos desafios, o primeiro é a falta de estradas ligando as cidades. O que significa que chegar até Apicum-açum e para ter acesso a Ilha de São João dos Lençóis teria mais de um obstáculo.
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